A festa

Cais de pessoas
Caras, figuras, figurinos
Desfile de sorrisos,
Amarelos, inertes;
Multidão.
Espalhadas, jogadas, aos montes
Incessantes
Incontinentes
Intermitentes
Ordenadas em confusão.
Conversa fiada,
Cruzada
Vozes que fundem
A inocência dormindo
Roda-viva de gente,
Girando em profusão.
Adorno, criado;
Contraste
As pérolas, o longo, a gravata,
Bandejas de pompa,
Levadas sobre a mão.
Circulam, rodeiam
Estancam;
E riem, suspiram, lamentam
Sem graça aparente;
E bebem e falam e trombam,
Tantas que são.
Entreolham, medem, censuram
Cabelos, alma e cascalho,
Andam sem rumo
Despejam veneno
Vão.
Gente que anda
Títulos no peito,
Iluminados na testa:
Me olha, me beija, me explora
Convidados de mais
Conhecidos de menos
Presentes à festa
Que eu dei;
Solidão.

Em cima do muro

Cheguei de surpresa na festa calorosa; a música alegre entretendo o povo todo, tarde cheia, a chácara abarrotada de pés descalços, chinelos espalhados e bolsas nas cadeiras; pratos às pilhas, limpos, talheres cruzados e restos serviam às moscas titubeantes.
Sentamo-nas todas à beira-mesa, o suor escorria por que o sol castigava; gente de toda idade povoando a enorme piscina, sentados ao guarda-sol, indo e pulando metidos nos seus trajes coloridos; risadas e batuques cortavam a fumaça e vinham ter conosco ali perto da churrasqueira, onde um balofo de sunga retorcia os espetos.
Mal chegamos e todas já nos separamos; embora algumas ficassem por ali – dado que me incluía –, a maior parte foi saindo para atrás da varanda, para dentro da água gelada, para cima da grama, pela porta de vidro. Ficamos as três ali, um instante esquecidas, à mercê do vai-e-vem, sobre a toalha de algodão; o tibum da colher sobre o molho, as migalhas dos pães que se pendiam do corte, caindo sobre o ladrilho como neve para um dócil cãozinho.
Na tarde quente restei-me num instante, entretida com todo o cenário, da companhia das minhas amigas; num lapso se escafederam para dentro da casa pela porta de correr, ao pé da qual se escancarava um tapete roliço, a essas alturas entrecortado por pegadas molhadas de todo tipo e tamanho.
Ainda que se passassem alguns dois minutos; em menos que isso me levantaram dali. Eram mãos fortes e calosas, pegaram-me de surpresa e me enfiaram embaixo d'água, lavaram a minha tampa e romperam o meu lacre, entornando meu levedo já morno a essa altura, meio esquentado ou pela falta de sombra ou pelo fogo da churrasqueira, mas o tanto para que uma mão tapasse a boca em repulsa e a outra me soltasse num desengasgue, onde fiquei esquecida até agora, choca, em cima do muro.

Vincent



Vai aqui minha primeira indicação musical. O ideal seria indicar uma banda, um popstar ou até todo conjunto da obra, um álbum, a discografia ou o que se tem produzido ao longo de toda uma carreira; por que com a diversidade de artistas e de estilos que alcançamos hoje em dia, indicar uma única música é como gotejar meio quarto de gota no maior dos oceanos. Mas essa vale a pena, aqui representada em seu videoclipe, com legendas em português. Trata-se de "Vincent", de Don McLean, que eu ouço desde pequeninho. Na verdade muita gente já ouviu mas não prestou atenção na letra; ou prestou atenção na letra mas não entendeu do que se tratava. É uma composição belíssima - e muito premiada - dedicada ao holandês Vincent van Gogh que, como se sabe, foi exímio em seu talento e incompreendido em seu tempo. Aqui, dois talentos em uma indicação: o de McLean, autor da também famosíssima 'American pie', e o de Van Gogh, cujas telas vão correndo de acordo com a canção. Registre-se também a competência da montagem do clipe. Tudo muito bonito. Eu recomendo.

Limpeza

Um casal estava debatendo com o vizinho sobre qual seria o melhor detergente do mercado.
- O melhor detergente é a bebida! - exclamou o vizinho.
- Como assim? - perguntou o marido.
E o vizinho responde:
- A bebida limpa o dinheiro, limpa a fama, limpa o juízo, limpa a beleza, limpa o stress, limpa a fortuna...

As velhinas

Duas velhinhas estão jogando sua canastra semanal. Uma delas olha para a outra e diz:
- Por favor, nao me leve a mal. Nós somos amigas há tanto tempo e agora eu não consigo me lembrar o seu nome, veja só a minha cabeça. Qual é mesmo o seu nome, querida?
A outra olha fixamente para amiga, por uns dois minutos e diz:
- Você precisa dessa informação para quando?

A arte da prudência

"A arte da prudência", de Baltasar Gracián é minha primeira indicação de leitura. É uma compilação de 150 dos 300 aforismos publicados originalmente em 1647, na Espanha. São conselhos de um dos mais poderosos escritores do barroco espanhol, filósofo e jesuíta, admirado por grandes pensadores como La Rochefoucauld, Goethe, Schopenhauer, Voltaire. Seus textos são engenhosos, concisos e reflexivos e abordam a moral, a religião, a sociedade e a política com alta qualidade de pensamento e estilo. Viveu de 1601 a 1658 e publicou 8 livros, entre ele este "Oraculo Manual y Arte de Prudencia", "um manual que advoga, numa linha um tanto pessimista, a virtude da prudência e a prática do realismo na conduta e convivência em sociedade", segundo escreve José Mario Pereira. Abaixo reproduzo dois aforismos e aqui inauguro um espaço para instilar o exercício de meditação
Ser pessoa de conversa agradável e saborosa (Página 19)
'A munição das pessoas inteligentes é a erudição sedutora, ou seja, um saber prático de todas as coisas comuns, mais inclinado ao saboroso e elevado que o vulgar. É conveniente ter uma boa reserva de frases engenhosas e de comportamentos galantes, sabendo empregá-los no momento adequado, pois, às vezes, é melhor o conselho contido em uma piada que o mais precioso ensinamento. Para alguns, a arte de conversar e a sabedoria no trato social tem sido mais valiosas que todos os conhecimentos acadêmicos.'
Ser diligente e inteligente (Página 28)
'A diligência executa rapidamente o que a inteligência pensou com calma. A pressa é uma paixão de tolos: como não percebem o perigo, agem sem atenção. Os sábios, ao contrário, costumam pecar por serem lentos, pois a reflexão obriga a parar. Às vezes, o acerto de uma observação se perde pela negligência em agir. A presteza é a mãe do sucesso. Muito consegue quem não deixa nada para amanhã. Correr devagar é um lema precioso.'

Pesca

No hospício um doido estava sentado num banquinho à frente de um balde com água, para dentro de onde ele segurava uma varinha de pescar. O diretor, curioso, resolve perguntar:
- O que você está pescando?
- Otários, doutor.
- Quantos você já pescou?
- O senhor é o quinto, já!

Conversar é uma arte

A expressividade tem um valor incalculável. Saber articular um pensamento e lhe dar forma e voz evita imprecisões de todo tipo. Mais do que dizer para o outro o que penso e sinto é me certificar de que fui ouvido e compreendido. E mais do que me articular e me expressar é receber atenção de presente, a grande retribução de qualquer emissor. Ocorre que no mundo de hoje, imensamente acelerado, onde se tem muito a fazer - ou se acha que tem -, onde muitos são breves nas suas palavras e poucos tem paciência para escutar, conversar requer estratégia. Só os diálogos mais importantes são blindados da influência de telefones, campainhas, ruídos ou influências externas e nem assim tem a garantia de que as suas mensagens serão entendidas. Isso em razão de outras pragas dos diálogos. Doar atenção, ter tempo disponível e se abster de pensamentos alheios para um parecer mais preciso é realmente uma arte. Para poucos.

O fascinante mundo da astrologia

Quanto mais me aprofundo em meus estudos sobre a astrologia, mais me prendo em suas complexas e magníficas teias. Sabe-se que no Tibete há astrólogos sérios e proeminantes que levam anos para desenhar, traçar, visualizar e entender o mapa astral de uma única pessoa. Assim, há o caso do monge escritor Lobsang Rampa que, ao nascer, teve as efemérides compiladas para o estudo da sua carta natal, que o orientou à vida monástica e às letras. Levado pelos pais ainda criança para cumprir tal presságio, notabilizou-se por legar à humanidade os ensinamentos tibetanos sobre a vida e a morte, corpo e alma, de onde viemos e para onde vamos, os predicados humanos que se perderam com o tempo, as civilizações que existiram na Terra, as religiões do mundo e outros inúmeros temas abordados em quase duas dezenas de livros, muitos dos quais compilações de cartas de seus leitores que lhe escreviam com perguntas das mais variadas. Sobretudo, Rampa legou à posteridade o que de fato lhe fora traçado como meta: os tibetanos já sabiam que seriam invadidos pela China e lhe coube contar a história do seu povo, de modo que as suas tradições e as suas letras não se perdessem sob o domínio chinês.

Os caçadores

Dois caçadores caminham na floresta quando um deles, subitamente, cai no chão com os olhos revirados.
- Não parece estar respirando.
O outro caçador pega o celular, liga para o serviço de emergência e diz:
- Meu amigo morreu! O que eu faço?`
Com voz pausada, o atendente explica:
- Mantenha a calma. A primeira coisa a fazer é ter certeza de que ele está morto`.
Vem um silêncio.
Logo depois se ouve um tiro.
A voz do caçador volta à linha. Ele diz:
- Ok. E agora?

Rerrerrecomeço

Como é a terceira vez que eu tento entrar no mundo dos blogues, vai aqui uma nota sobre os recomeços. Talvez seja contra a rotina pura e simples, contra o continuismo barato ou não goste de ter hora marcada para fazer certas coisas. Vale mais fazer assim, quando temos liberdade de escolha: venho e espalho 5 ou 6 dicas de filmes, livros ou músicas de uma vez, clipes, propagandas, notícias, contos ou histórias boas; reflexões, frases célebres, esporte, arte e cultura e uma piadinha para alegrar o dia. Publicitariamente, meu blog não terá nada diferente dos outros, exceto por uma simples virtude: eu ponho a minha alma em tudo o que eu faço.