Somos todos escritores

Há um sem-número de citações que ajuízam o legado dos escritores através dos tempos. A grosso modo exigem a originalidade, mais do que a fôrma quadrada ou a discurso redondo; contemplam o modo peculiar de enxergar o mundo e divergem quanto aos propósitos: da autoexpressão à literatura da alma de um povo, não há regras quando se tem algo a dizer. Talvez o treino e a técnica permitam maiores malabarismos, mas muitos se tornaram grandes escritores munidos apenas de sensibilidade ou de imaginação.
Ilustres escritores desenvolveram grandes aventuras sem nunca tê-las vivido. O alemão Karl May (1.842-1.921), por exemplo, foi acusado de trapaceiro por quem se recusava a acreditar que as suas descrições vigorosas eram frutos da sua invenção. Aliás, pode a imaginação ter salvo a inglesa Emily Brontë (1.818-1.848) de destino pior se não tivesse se abrigado com as irmãs Anne e Charlotte – também escritoras – em Angria, Gondal e Gaaldine, as terras imaginárias que povoavam com seus soldadinhos de chumbo.
Somos todos escritores – disse José Saramago, que Deus o tenha –, só que alguns escrevem e outros não. Mais do que garimpar as palavras que expressam o nosso propósito, escrever é um exercício de libertação. Aposto um trevo de quatro folhas que, como a leitura, a redação também remete a um estado outro de observação e criticismo que precisamos para a nossa evolução. Recomendo sinceramente – como recomendaria doses homeopáticas do sol da manhã e do luar com estrelas –, a mesma frequência de textinhos breves, se não verdadeiros, como atividade de interpretação do mundo. Quase garanto o acréscimo de percepção da vida e de um patamar de atenção, não fôssemos todos imperfeitos. Como escritores vemos histórias em brancas nuvens e gaiolas vazias; somos capazes de nos pendurar em poleiros pela graça do trocar de almas. Como escritores recolhemos os detalhes que ordinariamente nos escapariam. Como escritores temos a honrosa oportunidade de escrever a mais bela história da nossa própria vida.

3 comentários:

Unknown disse...

E de todos perdemos um dos maiores. José Saramago.
Continuem porque agora ainda é mais importante,nè?

Alexandra Deitos disse...

Sempre me perguntou por que escrevo... Também sempre me perguntou por que nem todos escrevem...
É engraçado, mas acho que talvez tanto o escrever quanto o não escrever sejam resultados dos medos... mas que no fim, nos levam a libertação da alma.
Não sei... Inquietações que gera pensar nisso.

Adorei o texto.

Ida Cabrini disse...

Eu não poderia deixar de registrar aqui que amei esse texto! Ele tá ajudando a crescer a sementinha que vc plantou!! Parabéns !