Uma vida de paixão

Cinebiografias são impagáveis. Não à toa é o meu gênero preferido, em que se pesem reconstruções de épocas, contextos, vestuários, modos, tradições e diálogos absolutamente imperiosos. “Balzac – A life of passion” (1.999), com Gerard Departieu, Jeanne Moreau, Fanny Ardant e grande elenco, reconstroi a trajetória do desmedido Honoré de Balzac (1799-1850): alto, corpulento, inventivo, falastrão, megalômano; incansável retratista da sociedade, competente vítima do sofrimento.
Assistir à sua história é acompanhar o amor de um rei aos seus súditos personagens. “Chamem o médico Bianchon – diz em seu leito de morte, ao que lhe responde a esposa: ele não pode vir, Balzac, ele não existe”.
Contemplar seus métodos e as suas 15 horas de dedicação diárias à literatura é conhecer com lupa a essência do maior apaixonado do modelo humano: do cidadão comum, do pai de família, do trabalhador, do religioso, dos amantes, da mulher. A ponto de deixar à espera a moça com quem teria em instantes uma relação carnal: algo no cenário lhe ativara o desejo da anotação inesperável.
Assim, em meio século de vida se torna o autor da monumental “A comédia humana” dividida em 88 narrativas – contos, romances, novelas, noveletas – que delineiam, quase enciclopedicamente, a sociedade francesa do seu século, em que Paris efervescia.
Como Monteiro Lobato teve seus vislumbres de editor; como Émile Zola meteu-se ao meio do povo para capturar-lhe os meneios - até que o acusassem de plagiar a realidade -, e como nenhum outro descreveu tão extensamente a alma humana.
Assistir aos diálogos entre os contemporâneos Victor Hugo, Eugène Sue, Stendhal e Balzac é compreender a importância do escritor, sobretudo como artesão das palavras. “Todos os escritores lutam – diz Victor Hugo a Eugène Sue –, contra a burrice, contra a ignorância, contra a indiferença. Por isso o homem inventou a escrita”.

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