Basta um vôo filhote. Asas delicadas, pequeninas; doçura: um
dia filhote. Basta a calçada; na avenida passa um carro, mas eu paro. Ela me
envolve com as suas cores e não posso prosseguir sem a sua singeleza. O mundo é
filhote. Basta. Como se nada mais fosse necessário, nem as manchetes estaladas
nas bancas, nem as promoções que eu nunca quis aproveitar nas vitrines. Basta
que a minha alma me leve, porque é ela quem viaja e compreende. E nas suas asas
eu vou, pousando nos polens e me estendendo ao jasmim à minha frente, filhote.
E o mundo é criança por onde eu ando: os gatos, o menino com
a bicicleta; os adultos. Os tons suaves se conservam e vejo leveza num tronco
robusto de árvore, cujos galhos não tinham folhas e em certas partes não tinham
cascas: poderia dizer que se sentia numa terra-de-ninguém, onde ninguém mais se
importava com ela além de mim. Poderia dizer que sangrava duas seivas de
amargura: uma pelos barulhos todos que passavam tão estridentes quanto o
silêncio que desejava ter e não tinha, outra pelas tristezas que seus milhões
de olhos testemunhavam sem poder distraí-los. Mesmo assim, de uma de suas
cinzas partes um galho filhote irrompera destemido, aonde um fio de esperança
decidiu pousar.
E penso se talvez devesse me mudar para uma cabana no meio
do Atlântico, rodeado de mares por todos os lados e criar minhas raízes nas
águas, longas e profusas, para serem levadas pela correnteza como a pequena
borboleta me levou hoje, quando o dia era ainda um filhote. Assim, continuei
eu, este broto um dia será a parte viva do tronco que foi cinza e se tornará
forte para aprender ou com as águas calmas, singrando serenidade, ou com as
tormentas e tempestades; sem afundar.
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